quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Saio da minha quietude para desabafar


São 33 anos de esporte. Me alimento da adrenalina dos jogos, dos lances bonitos, dos bizarros, da garra, da superação, da justiça, do roubo do juiz, das táticas, das provocações, das injustiças.

Já vi muita coisa nesses 33 anos, pois acompanho ao vivo os jogos, principalmente vôlei (desde Lufkin e Supergasbrás) e futebol (desde sempre). As histórias a contar são muitas.

Nesse tempo todo, eu, que sou dramática e vivo mesmo o momento, já berrei, xinguei, quebrei coisas, soquei paredes, pus bandeira na janela, fui esmagada na entrada do Maracanã várias vezes numa boa, perdi aula, fugi do trabalho (fiz isso nas olimpíadas passadas quando disse que ia ao banheiro e fui ver a Daiane), briguei com pessoas, pulei feito criança em comemorações, abracei quem não conhecia... mas nunca havia chorado até hoje.

É, hoje eu chorei pela primeira vez por causa de um jogo.

Na verdade, o choro não foi exatamente por causa da derrota das meninas do futebol da forma como foi, injusta. Injustiça no futebol é o que mais tem. Nem sempre vence o melhor e talvez por isso eu goste tanto, já que a emoção é maior.

O resultado da final foi injusto até certo ponto. O Brasil joga um futebol mais bonito, ok, mas isso não quer dizer que seja o melhor. Desde o primeiro jogo falo sobre os problemas técnicos da seleção e hoje vi mais um problema: o preparo físico. O Brasil jogou melhor? Não sei, sinceramente. Os EUA foram perfeitos. Deixaram o Brasil correr. No final do primeiro tempo as brasileiras já estavam sem pernas. Mas, as americanas são cruéis. No segundo tempo continuaram deixando as brasileiras correrem. Que maldade. Já no início desta etapa perdemos Daniela que não conseguia ficar em pé. As outras tiveram que ficar em campo, mas não tinham mais condições. O Brasil passou a jogar no bumba-meu-boi.

De qualquer forma o placar não foi justo. Mas, enfim, são coisas do futebol.

Voltando ao choro... não choro pelo resultado injusto. Não choro por pena. Não passo a mão na cabeça delas, porque o Brasil tem muito que melhorar. Tenho MUITAS críticas ao esporte brasileiro e não e não seria diferente com o futebol. A prata não é boa.

Chorei por causa das meninas. Guerreiras como ninguém, mulheres que tiveram a coragem de enfrentar muitas dificuldades pelo amor ao futebol, preconceito da família, de amigos, falta de incentivo, sem apoio financeiro decente, gozações do próprio povo. Quem nunca ouviu uma piadinha em jogo de mulheres?

Chorei porque passei por isso. Eu jogava futebol quando era criança e adolescente. Os meninos com quem jogava me adoravam, mas já sentia preconceito dos adultos. Quantas vezes ouvi que não era coisa de menina. Eu nem ligava, mas depois de uma certa idade o preconceito só ficou pior e eu não tive coragem para enfrentar.

Choro porque elas precisavam da medalha de ouro. Não para “mostrar para o Brasil” ou “mostrar para os homens como se joga” ou “mostrar para a CBF e clubes que precisam de apoio”. As mulheres não precisam mostrar para os homens como se joga. Isso não existe. E o Brasil precisa de apoio JUSTAMENTE porque falta a técnica e a preparação que países mais desenvolvidos têm.

Elas mereciam e precisavam do ouro para saberem elas mesmas que PODEM GANHAR. Que são as melhores. E para não ficarem perguntando aos céus, com lágrimas nos olhos: “Meu Deus, o que eu fiz de errado?”.

Não fez nada de errado, Marta.

5 comentários:

Juliana disse...

muita gente chorou, é impressionante. e é impressionante como muita gente tb pouco se fodeu, nem viu o jogo. eu ouvi que 'ah, é o de mulher'. como assim, meu deus. elas são boas, elas merecem mais apoio e investimentos. como funciona isso?

marta disse...

Juli, o problema é que não tem retorno financeiro aqui no Brasil e, infelizmente, a CBF quer é dinheiro.

Acho que a maioria dessas jogadoras estão no exterior, mas as que ficam no Brasil são praticamente amadoras. A goleira Barbara, por exemplo, está sem time, sem emprego, sem nada.

Depois do Pan tentaram fazer um campeonato brasileiro feminino, mas alguém soube? Nem eu. Se o povo pouco se importa, que dirá clubes, CBF e empresas.

=/

Anônimo disse...

gente, eu sempre choro em comemorações esportivas, embora eu não tenha realmente qualquer ligação com esportes. e é verdade, nem tô sendo irônica. tem época que não posso ver nem globo esporte... haha

mas é que dá uma emoção essa ilusão de superação (no mineirão) que o esporte dá, né não? no fundo (ui) o que é que ser vencedor num esporte significa? e o que importa ser um vencedor em qualquer outra coisa? e, afinal, o que significa vencer?

ih, acho que acordei com um ponto de interrogação a mais no meio da testa hoje... é cada uma...

bom, beijinhos pra vcs!

marta disse...

hahaha... acordou questionadora, né, leticia?

sabe que eu gosto quando eu acordo assim? parece que estou mais viva...

enfim... viajei, né?

beijo! =)

ps: adorei as rimas!

jordana disse...

eu já chorei vendo futebol, quando vi o fernandão, capitão do internacional, levantar a taça de campeão do mundo. chorei como gremista fanática, daquelas que vai ao estádio e canta todas as músicas de torcida organizada, que bate palmas, come churrasquinho de gato na saída e leva até o radinho para acompanhar os outros jogos da rodada. foi uma das manhãs mais tristes da minha vida, lembro perfeitamente.

chorar dessa vez não foi por motivo menos nobre.

em tempo: belíssimo texto, by the way.