Botafogo, 29 de julho de 2009
Um mês que ela tentou. É uma presença forte e impalpável. Ontem a mãe dela veio aqui e me trouxe sapatos dela, para eu usar. Quer que eu vá à casa dela e pegue livros também. Hoje já mudei de idéia, acho que vou usá-los.
O choro chega até o nariz e quase transborda nos olhos, mas é sugado para dentro.
E hoje, justo hoje, ligaram da PR5, falando sobre a bolsa dela. R$ 400 para a mãe receber. Cairá na minha conta e vou entregar à Dona Renaide. A mulher lá disse certo: "não é merda nenhuma, mas é uma ajuda financeira". Ana Cecília o nome dela. Ligou para o meu celular e ficamos conversando por mais de meia hora. Ela me contando sobre outros casos de bolsistas suicidas e eu desabafando sobre o que está sendo para mim lidar com tudo isso.
Eu queria me afastar de tudo, até de mim, sei lá. Viajar e sumir. Esquecer de algumas coisas, mas não dá. Mas eu só queria um tempo para mim.
Vem tudo à cabeça. O corpo, o caixão, a terra suja e revirada, a gente junto, Direção III, Lagoa, macarrão com os mendigos, Estamira, os DVDs que ela gravou para mim, o DVD que eu não gravei para ela, as aulas que vão começar sem ela, a Direção V sem Beckett e sem Amanda. Aulas sem Amanda, Leme sem Amanda, caminho da faculdade sem Amanda, Bob's sem Amanda, Uno sem Amanda, madrugada sem Amanda, cigarreiras sem Amanda.
Ela escreveu que me amava e que eu era muito importante para ela e escrevo aqui que eu a amava e que ela É muito importante para mim. É, sem dúvida, uma amiga de 12 anos (Conta Comigo). Os melhores amigos são aqueles de quando a gente tem 12 anos.
Foi com ela que me sentei na Lagoa e vi o Sol nascer e depois andei até Botafogo. Foi com ela que descobri a Pedra do Leme. Foi com ela que voltei a escrever. Foi com ela que comprei Coca-Cola de R$ i e pizza da Domino's de R$ 40.
Fiz planos de pescar e ir à praia que não aconteceram e jamais acontecerão. Tirei fotos que se perderam e jamais serão tiradas novamente.
Fomos vestidas com a mesma roupa na última festa de formatura da faculdade, tínhamos o mesmo sapato com bolinhas brancas. O dela vermelho e o meu azul. Celulares da Claro com bônus para falar sempre uma com a outra. Pouco dinheiro no bolso, vivência de subúrbio, alma de artista, cinismo e ironias diante dos problemas. Levávamos a vida tão a sério que éramos caricaturas de nós mesmas.
Tenho o que ficou e tenho sorte até demais. Nada mais vai me ferir.
m.f.
6 comentários:
Marymilia, como assim, meu deus?
É isso mesmo, Cindy. Ela se suicidou. Tomou 120 comprimidos numa segunda-feira de um mês de junho. Não encontro jeito mais sutil de dizer isso.
Difícil comentar isso. Me dá vontade de dizer tanta coisa, mas fica um tanto fora de tempo... Queria ter falado com ela. Mas ainda assim poderia ter sido inútil... Bem, depois vou tentar um post, como vc fez.
Não te conheço, não a conhecia. Senti, obviamente nem um milésimo do que sentiste, apenas pelas palavras que escreveu. Perdas são doloridas demais. Infelizmente convivemos com elas todos os dias. Resta-nos aproveitar cada momento que temos e curtir a todos que nos amam.
Força!
;o*
Uma vez Cindy comentou que ficou pensando sobre um post aqui do a lot sem conseguir escrever. Aconteceu comigo agora. Eu me emocionei bastante e não consigo colocar isso em palavras.
Mas repito o que meu grande amigo falou aqui em cima: vamos aproveitar cada momento que temos e curtir a todos que nos amam.
Eu sou meio anta para ler as respostas, mas li agora e agradeço as palavras e mesmo a falta delas. Uma coisa assim é mesmo difícil de se verbalizar.
Beijos a todos, estou bem.
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